não sei bem como - não me lembro de o ter ouvido recentemente -, hoje acordei com o carlos paião na cabeça a cantar sobre o pó de arroz. o arroz, vejamos bem, é digno do nosso respeito e, se acaso fosse criatura capaz de o apreciar, mereceria o nosso reconhecimento. mais ainda nesta ásia que agora me sustenta e cuja antiquíssima civilização se fica a dever em grande medida ao bago em questão. mas não vou aqui insistir em atravessar muitos séculos, recuo apenas até ao verão passado e a um passeio em que tive a feliz companhia de uma mão-cheia de amigos especiais.
num português muito prosaico e estéril, 龍勝 traduzir-se-ia por 'espinha dorsal do dragão'. ainda que a imagem seja bonita e apropriada, aceitemos por favor transliterar o nome chinês: longsheng fica para as bandas do sul da china, a duas horas de guilin, e, talvez à conta do magnetismo turístico da vizinha, não recebe tantos visitantes como seria de esperar. na verdade, os atractivos não são menores: uma extensão de monumentais arrozais centenários plantados em socalcos, abraçados a encostas de uma inclinação capaz de nos dobrar as nossas próprias espinhas. dizem que é lindo na primavera, quando a água dos arrozais espelha o céu; dizem que é lindo no outono, quando as plantas estão douradas e prontas a colher; dizem ainda que é lindo no inverno, quando os socalcos se cobrem de neve. pois nós fomos no pico do verão, e lindo era.
aninhada no meio dos campos, numa curva apertada do vale, fica a aldeia de madeira por onde corre um vital fio de água. aqui dorme-se por tuta e meia e come-se com vista para um sortido de verdes e um sossego raro: para os mais aventurosos, ratos do bambu fresquinhos a saltar; para os mais convencionais, e sem fugir muito aos tópicos do momento, arroz (isso mesmo) com galinha cozidos a vapor dentro de uma cana de bambu. adicionemos a isto a possibilidade de uma massagem aos pés, e estão esgotadas as actividades que a aldeia oferece; a menos, claro está, que sejamos gente inclinada a apreciar a diversidade humana, já que estas ladeiras são a mátria de algumas das minorias étnicas da china.
longsheng é terra dos miao, coqueluche dos antropólogos por as suas mulheres usarem os cabelos mais compridos do planeta - como aliás demonstrarão com prazer ao visitante incauto a troco de certa e determinada quantia de yuan; coqueluche ainda dos linguistas por o seu idioma ser membro maior de um pequeno grupo de línguas, dispersas daqui até à birmânia, tão diversas das restantes do sudeste asiático que ainda hoje se aceita constituírem uma família independente: a família miao-yao, ou hmong-mien. 'fascinante', dirão alguns. e com esta bocada de curiosidades vos deixo, que começa a escurecer e impõe-se planear o arroz do jantar.
30.4.11
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