27.4.08

Instituto “Camões da Madragoa”

AVISO - longo texto a estibordo
o camões da madragoa era uma velho de vistas anormalmente curtas – cego de um olho, com o restante via mal ao longe – que no finzinho do século dezanove habitou um casebre no coração daquele castiço bairro lisboeta. sabe-se hoje que o velho camões da madragoa não sabia ler nem escrever, que o afligiam recorrentes acessos de autismo, e que ao falar chiava as sibilantes de forma tão desagradável que punha esgares nas feições dos ouvintes. mas, ui!, o que ele bailaricava de bem depois de meio copito de tinto! e portanto o camões veio a tornar-se o imperador das marchas de santo antónio, a eterna coqueluche da sua madragoa natal.

foi pois em honra a esta personagem por mim acabadinha de ficcionar que se veio a baptizar o braço armado do governo português na batalha pela promoção da língua portuguesa no mundo – o instituto camões da madragoa (icm). fiel ao padroeiro, que apenas abandonava a sua rua por altura dos santos e somente até à avenida da liberdade, o icm vai lentamente anunciando aos seus aspirantes a leitor, em florilégios institucionais: ‘se fores de lisboa, melhor para ti; se não fores, olha fosses’.

tive há algum tempo atrás o prazer de me candidatar – santinho – ao posto de leitor do icm, um concurso aberto durante o alucinante período de cinco dias úteis. estas coisas circulam bem é de boca em boca, já se sabe. mas qualquer patego perceberá que de boca em boca se chega mais depressa do marquês à alameda da universidade do que (sei lá) a chittagong ou angra do heroísmo. o processo de selecção conheceu três fases, a saber:

- envio das candidaturas. por correio electrónico, que fácil que é;

- prova escrita, para a qual foram seleccionados trinta e dois felizardos; compareça daqui a uma semana na sede do icm em lisboa, sita na rua não-sei-quê-e-troca-o-passo número tal. ah, mas eu moro na holanda, não dá para fazer a prova aqui perto? hmm, vai ser difícil, só pedindo por escrito. excelentíssima senhora presidente do icm, faça lá o jeitinho. pronto pronto, vá, mas só desta vez, sem exemplo. eternamente grato, oh eternamente grato;

- entrevista aos sete finalistas; compareça na sede do icm em lisboa, sita na rua não-sei-quê-e-troca-o-passo número tal. ah, mas não dá para fazer por telefone? não. e há ajudas de custo para transporte e alojamento? não. então mas. apareça e é se quer.

eis o resultado. se estiver interessado, poderá ter acesso às actas referentes à avaliação da sua candidatura, porque isto a gente somos transparentes e isso assim. ah bom, solicitaria então que me fosse enviada uma cópia da acta em questão. concerteza, estimado senhor, poderá consultá-la entre as nove e as cinco na sede do icm em lisboa, sita na rua não-sei-quê-e-troca-o-passo número tal...

7 comentários:

Anónimo disse...

Ah, meu amigo... bem vindo ao mundo encantado dos concursos públicos, onde tudo não é o que parece.
Been there, done that. Ou, como dizem os outros: "Fool me once, shame on you. Fool me twice, shame on me."

Unknown disse...

Precisas de apoio jurídico para impugnar o concurso?

;) Aqui estamos para ajudar, for free. Até te poupo a deslocação para a consulta das actas.

Se sim, contacte rápido, porque os prazos não são grandes.

AP disse...

Claro, Herlindo. Dá-lhe na impugnação. E olha que não há ninguém melhor para isso do que a Raimunda...

H. Cardoso disse...

Ah, meus amigos, agradeco o apoio. Mas nao estou a pensar impugnar o concurso - tenho a certeza que a rejeicao e justificadissima, nao estou minimamente preocupado com isso ate porque sai da entrevista com muito ma impressao do IC(M). Para alem disso acho que o prazo legal para ver a tal acta ja passou - no regulamento do concurso nao se mencionava nenhum prazo, mas enfim...

Agora o que me chateia e este provincianismo lisboeta de pensar que toda a gente esta ali a mao de semear. Autismo, e o que e, como o Camoes da Madragoa. Digam-me la uma coisa: nao ha nenhuma legislacao que obrigue os organismos publicos a garantir (com ajudas de custo, prazos alargados ou outros) que nenhum candidato seja prejudicado por morar na Conchichina? Como e que isso funciona, quais sao as obrigacoes deles nestes casos?

Unknown disse...

Pois, infelizmente desconheço!

Quanto à consulta, podes sempre passar procuração a alguém. Agora, quanto à prestação das provas, desconheço que haja algum mecanismo de protecção e duvido mesmo que exista.

É o país que temos...

H. Cardoso disse...

NOVIDADES:

Dizem-me de la que o prazo para requerer a acta e de oito dias uteis e que "a intenção de melhorar o desempenho em futuras oportunidades" nao e um argumento valido para ter acesso.

Ou seja, mais valia ter logo dito, sem floreados, que a minha intencao era assegurar-me de que fui correctamente avaliado e de que a decisao foi justa. Quanto aos oito dias, a realidade e que ninguem comunicou o resultado aos candidatos, eu fiquei a saber porque por acaso passei pelo website do dito IC(M). Esta historia de termos o direito de aceder as nossas actas e uma fantochada, ainda estou para perceber que tipo de argumentos serao validos para as requerer... Ah, mas se quiser voar de Diu a Lisboa, sempre posso ter acesso presencial ao documento.

Imagino que isto esteja tudo dentro da lei e tal, mas a arrogancia e de bradar aos ceus.

GWB disse...

fixe o teu blog.